quinta-feira, 29 de maio de 2014

Filosofia portuguesa na Madeira

Funchal, 7 de Junho de 1988: Francisco Moraes Sarmento, Orlando Vitorino, António Quadros e António Braz Teixeira.  Para participar num colóquio sobre a filosofia portuguesa e a autonomia regional.

quarta-feira, 28 de maio de 2014

A propósito de lugares minhotos

 Certa vez regressei a Santo Estevam, pequena aldeia situada entre Chaves e a fronteira, no norte de Portugal. O chamamento do campo fazia parte dos meus anos de aprendizagem, mas as curvas da vida acabaram por desviar a minha atenção para outros mundos. Foi com surpresa que cheguei a uma aldeia com acessos alcatroados e sinalização, coisas que fazem longínqua as memórias da estrada batida e, principalmente, a nuvem de pó que anunciavam visitas ou tão somente o regresso do meu Tio Chico a casa no final do dia. 

O mais estranho foi mesmo a ausência de animais nas ruas: nem galinhas, nem patos ou gansos, nem porcas e os seus recos, nem vacas, burros, mulas ou cavalos. Longe vão os tempos em que corria até ser vencido pelo cansaço atrás das galinhas ou fugia das investidas das fémeas com crias por ter pisado, por incúria, terrenos proibidos.

O ecosistema estava alterado e tinha tornado a "minha" aldeia cheia de vida e graça, num deserto de gente a animais. Só o edificado ainda permanecia com alguma memória dos tempos em que pessoas e animais viviam faziam parte do mesmo cosmos. Claro, pontuado com alguns estilos a roçar o mau gosto. Agora, Santo Estevam, nome de antigos pergaminhos, é um aldeia limpinha, asseada, quase asséptica.

À perplexidade que, sem demora, exprimi, devolveu o meu Tio uma explicação: "As novas regras comunitárias proíbem animais à solta nas ruas".

Vem esta história a propósito do que observo nos lugares do Minho e na Serra do Gerês: animais à solta. Os garranos curtos de patas, rústicos e resistentes aos obstáculos de montanha, fitam-nos desconfiados e mantém sempre uma distância prudente em relação aos estranhos; o gado de raça barrosã sobressai na paisagem verdejante pela corpulência, a armadura em forma de lira, grande e pontiaguda, e pelagem castanha clara, cor de palha ou acerejado, são mais dóceis, teimosos e não têm pressa. Todos parecem sem dono e sabem os trilhos que os levam a bom porto.

Num relâmpago, emergem de nenhures saudades da velha aldeia, Santo Estevam da minha adolescência e dum tempo que os animais integravam um outro cosmos, em que os aqueciam a casa, davam alimento e faziam companhia. Mais humano e harmonioso porque todos sabiam a distinção entre o homem e o animal.

terça-feira, 27 de maio de 2014

"Não é a mesma pessoa!"

No início da minha vida de jornalista, trabalhava no semanário "Tempo", numa altura em que António Quadros escrevia semanalmente uma secção literária, a "Ideias e Livros" (anos oitenta) . Um dia, Peixe Dias, chefe de redacção, decidiu despedir-me, ideia que não foi consensual no directório do jornal. 

À falta de mais argumentos, João Isidro, sub-chefe de redacção, com a edição da semana em punho, acercou-se de Peixe Dias e disse-lhe: "Lê o que o António Quadros escreve sobre o Moraes Sarmento! Estás a despedir a pessoa errada!".  Confrontado com a situação e depois de ler o trecho em causa, Peixe Dias rematou: "Não é a mesma pessoa!" E assim fui parar ao Semanário que iniciava a sua publicação.

Num artigo sobre as revistas culturais e literárias, Quadros escreveu o seguinte: "Ensaio é uma revista de jovens universitários, dirigida por Francisco Moraes Sarmento. Distingue-se, para melhor, da maioria das publicações do género, pela atenção prestada ao pensamento, pela preocupação de uma reflexão filosófica, pela coragem das suas posições, bastantes heterodoxas em relação às linhas habituais de um vanguardismo em geral teleguiado por modelos pré-determinados e extrínsecos à nossa cultura".